sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

A Árvore da Vida (1957)



Sinopse: Neste melodrama sobre a guerra civil norte-americana, um professor se apaixona por uma mulher do sul, mas a Guerra Civil coloca obstáculos aos dois. Ao estilo ...E O Vento Levou, Elizabeth Taylor interpreta uma garota mimada que se apaixona por Montgomery Clift, que está noivo de outra. Mas ela o conquistará, mesmo que tenha que usar truques sujos. Quando a Guerra estoura, ele parte para as batalhas, enquanto ela entra em depressão e enlouquece. Com o fim dos conflitos, Clift retorna para casa e tem um novo desafio: ajudar a esposa a sair da insanidade e manter a família unida. (Fonte: Cine Click)

Motivo para assistir: Saber porque esse filme não sobreviveu ao tempo

Estreia – 20/12/1957 (nos EUA) – Uma história da vida pessoal do blogueiro: ele sempre quis assistir a esse filme por conta de uma fotografia enorme do Rio de Janeiro de antigamente que ele adorava ver quando, ainda criança, ia lanchar com seus pais no Palheta, uma lanchonete tradicional que ficava na Praça Saens Peña, Tijuca. Hoje o Palheta virou uma farmácia, a fotografia se perdeu e, anos depois, ele consegue ver A Árvore da Vida, não o elogiado (e ainda não visto pelo Blog) filme de Terrence Malick, mas essa produção de 1957 do já experiente diretor Edward Dmytryk. A realização desse longa parece ter sido um erro e serve de balde de água fria para aqueles que acham que basta ser dos anos 1950 e made in Hollywood para ser um clássico. Mesmo assim, ele deu a primeira das cinco indicações de Elizabeth Taylor ao Oscar (ela perdeu para Joanne Woodward por As Três Faces de Eva), além das nomeações por Música, Figurino e Direção de Arte. Pouco, para aquele que foi considera na época, um da (ou uma das) produções mais caras da História – que construiu inteiramente a cidade de Freehaven e foi pioneira no processo conhecido como Câmera 65 na MGM (o segundo filme a ser feito dessa maneira, que substituiu o Cinerama, foi Ben-Hur).

Realizado no auge da criatividade dos cineastas norte-americanos, os primeiros quarenta minutos do longa de duas horas e cinqüenta minutos de duração são quase impecáveis. A canção de abertura Raintree Country (título original de A Árvore da Vida) interpretada por Nat “King” Cole, é linda. A introdução ambientando o espectador em uma formatura no norte dos Estados Unidos no ano de 1859 é notável. O primeiro conflito fica por conta do relacionamento de John (Montgomery Clift) e Nell (Eva Marie Saint). Clift, de poucos e bons filmes, sofreu um grave acidente de carro durante as filmagens e teve seus movimentos comprometidos para sempre e seu rosto totalmente desfigurado, sendo a primeira metade de A Árvore da Vida o único registro em cores da “aparência original” do ator. No longa, John sonha em ser escritor e o pai, muito religioso, não deixa de incentivá-lo (ao contrário da mãe). Ao mesmo tempo ele se mostra contra o amor entre os jovens, por conta da origem humilde da moça. Tudo muito bem apresentado. A lenda da árvore da vida parece dar um toque de fantasia a um drama familiar – que no começo lembra muito A Caldeira do Diabo (lançado no mesmo ano) e outros do gênero. Todavia, esse ótimo panorama feito pelo roteiro se perde.

O segundo conflito, que tomará a maior parte do filme, começa quando John conhece a sulista Susanna e Elizabeth Taylor entra em cena. Ela é filha de um falecido Senador e parece ter a dignidade que o pai de John quer. A aproximação dos dois não é freada pelos ciúmes de Nell e o casamento com Susanna dá uma lição àqueles que em um impulso se casam sem conhecer o futuro companheiro.

O roteiro de Millard Kaufman se perde de vez quando entra em cena a Guerra Civil Americana. Não há uma definição da trama, um indicativo se John assumirá a posição de ianque em um ambiente sulista ou se seu foco será o mistério no trauma do passado de Susanna. Taylor entrega uma interpretação que lembra a Blanche de Vivien Leigh (Uma Rua Chamada Pecado, que marcou época ao ser lançado seis anos antes), a mesma de E O Vento Levou – que trata de maneira tão mais eficiente a Guerra de Secessão que chega a dar pena.

Um lampejo de graça é o que consegue o texto na passagem em que John, eleitor de Lincoln, se nega a ter escravos. Porém, tudo descamba para uma discussão política batida em um roteiro que atira para todos os lados com tramas que não combinam. Não soube inserir o contexto histórico no melodrama e vice-versa. Na hora final, então, A Árvore da Vida está perdido em sua indefinição: sem drama, romance, guerra ou história que o sustente minimamente. Nota 5



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Backbeat - Os Cinco Rapazes de Liverpool



Sinopse: Liverpool, 1960. John Lennon (Ian Hart) e Stuart Sutcliffe (Stephen Dorff) organizam uma viagem a Hamburgo para tocar com Paul McCartney (Gary Bakewell), George Harrison (Chris O'Neill) e Ringo Starr (Paul Duckworth) em bares. Após o músico e artista plástico Klaus Voormann (Kai Wiesinger) assistir uma de suas apresentações ele fica entusiasmado com a banda, já batizada de The Beatles, e convence sua namorada, Astrid (Sheryl Lee), a apresentá-los para o circuito alternativo da cidade. Aos poucos Sutcliffe se aproxima de Astrid e se afasta cada vez mais da banda, que acaba recebendo um convite para gravar seu primeiro disco. (Fonte: Inter Filmes)

Motivo para assistir: Saber que os Beatles quase foram cinco.

Estreia – 01/04/1994 (no Reino Unido) – Backbeat peca pela indefinição de seu roteiro. A idéia era retratar a juventude de Stuart Sutcliffe (Stephen Dorff, que após dezenas de filmes de ação, foi peça importante em Inimigos Públicos e elevado a protagonista por Sofia Coppola no modorrento Um Lugar Qualquer), primeiro baixista da banda que viria a se tornar os Beatles, bem como seu dilema entre ser músico ou pintor até sua morte precoce, aos 21 anos. Porém, a produção não consegue deixar de utilizar o interesse pelo grupo britânico e cai na biografia fácil, permeada de clássicos do rock dos anos 1950, além de insistir em retratar mais a tentativa frustrada de Paul, John, George e Ringo fazerem sucesso em Hamburgo, Alemanha.

Não há preocupação em ambientar o espectador, nem em reconstituir com fidelidade a época em que se passa a história. A escalação do elenco não foi das melhores e há momentos em que Ian Hart, intérprete de John Lennon parece mais o Billie Joe do Green Day. Hart, aliás, interpretou Lennon em seus dois primeiros longas (em 1991 ele protagonizou The Hours and the Times). Houve a opção de criar um estilo punk-rock anos 1990 na trilha sonora de forma proposital, para que os espectadores da época pudessem “entender” como a chegada dos Beatles foi captada, ao passo em que nenhuma composição de Lennon e McCartney foi aproveitada – o que se mostra um grande equívoco.

O cerne da questão que desgastou a relação entre Stu e os companheiros de banda é mostrada de forma superficial na segunda metade. O envolvimento daquele com Astrid, que leva o baixista a faltar uma importante gravação e faz com que os ingleses deixem de partilhar do mesmo sonho, perde espaço para cenas de sexo e números musicais nada informativos – presentes em uma produção qualquer. Nesse ponto, Backbeat lembra muito algumas biografias brasileiras como Garrincha – Estrela Solitária. O diretor e roteirista Iain Softley não fez muitos trabalhos depois de sua estréia em Backbeat. Voltará a ser creditado como roteirista esse ano em Trap for Cinderella, atualmente em pós-produção. Como diretor, além do já citado, outros cinco trabalhos apenas: Hackers, Asas do Amor, K-Pax – O Caminho da Luz, A Chave Mestra e Coração de Tinta. Ou seja, um diretor de filmes medianos.

Da mesma forma que Madonna – A Inocência Perdida, Os Cinco Rapazes de Liverpool não abrange os anos de sucesso dos Beatles, parando sua narrativa no começo da Beatlemania no Cavern Club – época da expulsão deles da Alemanha, local que voltariam como astros do rock logo depois. Serve apenas para quem é curioso em saber de um tempo em que os astros não eram fabricados. Nota 4



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As Horas



Sinopse: Em três períodos diferentes vivem três mulheres ligadas ao livro "Mrs. Dalloway". Em 1923 vive Virginia Woolf (Nicole Kidman), autora do livro, que enfrenta uma crise de depressão e idéias de suicídio. Em 1949 vive Laura Brown (Julianne Moore), uma dona de casa grávida que mora em Los Angeles, planeja uma festa de aniversário para o marido e não consegue parar de ler o livro. Nos dias atuais vive Clarissa Vaughn (Meryl Streep), uma editora de livros que vive em Nova York e dá uma festa para Richard (Ed Harris), escritor que fora seu amante no passado e hoje está com Aids e morrendo. (Fonte: Adoro Cinema)

Motivo para assistir: Como ser original contando uma história conhecida

Estreia – 28/02/2003 – A primeira cena de As Horas (o suicídio de Virginia Woolf) mostra que é possível realizar grandes dramas sem deixar de entregar uma produção caprichada, com cenas grandiosas. O espectador-médio sentirá falta de ter lido Sra. Dalloway, um dos primeiros romance da escritora – que teve As Horas como primeiro título. Mesmo assim, ficará pregado na cadeira aguardando o cruzamento das três histórias. O roteirista David Hare, vencedor pelo Sindicato dos Roteiristas, e indicado ao Oscar duas vezes por dois trabalhos notáveis (As Horas e O Leitor) faz parecer simples o complexo trabalho de intercalar três narrativas em menos de duas horas. As Horas é um romance vencedor do Prêmio Pulitzer em 1999, escritor por Michael Cunningham, que escreveu para o cinema Ao Entardecer, outro longa com Meryl Streep muito elogiado e ainda não visto pelo blog. Já o diretor Stephen Dalry (quatro filmes e três indicações ao Oscar: Billy Elliot, As Horas e O Leitor. Tão Longe e Tão Perto pode lhe render a quarta em 2012) e o experiente editor Peter Boyle (também indicado por esse trabalho) atingem o equilíbrio necessário para que o longa seja fácil de digerir e que nenhum ego das três grandes protagonistas seja ferido.

Porém, o maior destaque talvez seja o uso constante da trilha sonora, que passa longe da mera repetição incidental e é usada como importante elemento de As Horas. Ela também foi lembrada pela Academia, que nomeou a produção a dez prêmios. Além dos já citados, apareceu nas categorias Filme, Atriz e Ator Coadjuvantes (Julianne Morre e Ed Harris) e Figurino, perdendo em quase todas as categorias para Chicago. Sem contar o prêmio de Atriz para Nicole Kidman e seu nariz perfeitamente falso, que levaram também o Bafta, o Globo de Ouro e dividiram o troféu do Festival de Berlin com Moore e Streep. Nariz falso, aliás, que ao ser retocado por computador, desqualificou As Horas a concorrer como melhor maquiagem no Oscar. O esforço de Kidman para o papel, sem dúvida o melhor da carreira, foi recompensando. Apesar de ser laureada como atriz principal, sua participação é a menor. Dura 28 minutos, enquanto a de Moore dura 33 e a de Streep 42. Ela chegou a aprender a escrever com a mãe direita para representar Woolf fiel e naturalmente, assim como Julia Roberts em Erin Brokovich dois anos antes (ela também venceu o Oscar). Optou por não imitar a voz de Woolf, conhecida por ser esquisita, evitando dar um ar cômico à personagem. Gostou tanto de seu nariz que continuava usando fora das filmagens para fugir dos curiosos que a perseguiam (à época ela atravessava o processo de divórcio com Tom Cruise).

Cada um encontrará uma trama que lhe interessa mais do que outra. A vida de Laura Brown, que projeta Sra. Dalloway – o livro que está lendo naquele momento – em sua vizinha, me parece menos marcante que a de Clarissa, que foge de sua realidade de outra maneira, cuidando mais de Richard do que de si mesma. Moore está muito madura em seu papel, inspirado na mãe do autor do livro. Na pós-produção, Cunningham pediu para lhe enviarem alguns trechos de As Horas pois sua mãe, em fase terminal de câncer, queria assistir o máximo que pudesse antes de falecer. Streep, como sempre, entrega uma interpretação muito convincente, no papel de uma senhora frustrada não só com sua vida, mas com a idéia de não ter mais idade para buscar a felicidade. Ela optou por não reler Sra. Dalloway para o filme, pois, assim como sua personagem, já havia lido na época da escola e não tinha entendido muita coisa. Um filme notável, feito para assistir mais de uma vez. Nota 9



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quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Anatomia de um Crime




Sinopse: No Michigan, Paul Biegler é um advogado que é auxiliado por um alcoólatra, Parnell McCarthy. Após ter recusado o caso inicialmente, ele decide aceitar a defesa de Frederick Manion, um tenente do exército acusado de assassinato. O réu alega que a vítima violentou Laura Manion, sua mulher, mas seu oponente é Claude Dancer, um conceituado promotor que afirma que a alegação do réu é falsa e que Laura, que tem uma reputação de promíscua, estava realmente tendo um caso com o bartender assassinado, sendo que durante um acesso de cíúme Frederick teria intencionalmente cometido o crime. (Fonte: Cine Players)

Motivo para assistir: Um clássico drama de tribunal

Estreia – 01/07/1959 (nos EUA) – James Stewart, um dos rostos da Era de Ouro de Hollywood, entrega mais uma atuação sóbria e admirável em mais um clássico em que simplesmente não há argumentos para críticas. Anatomia de um Crime narra a história de Paul Biegler, um advogado desmotivado que só quer saber de pescar após perder o cargo de Promotor do Distrito. Passa horas no bar com seu amigo bêbado, até que um cliente cai em seu colo. Considerado polêmico na época por usar palavras fortes ("bitch", "contraceptive", "panties", "penetration", "rape", "slut" e "sperm"), o longa foi banido de Chicago e reprovado pelo pai do protagonista, que circulava por sua cidade pedindo para que as pessoas não o assistissem. Mesmo assim, é lembrado até hoje como um dos 10 dramas de tribunal mais importantes do cinema americano.

Não é a toa que essa fita deu a Stewart um troféu no Festival de Veneza e sua quinta indicação ao Oscar (ele venceu por Núpcias de Escândalo e perdeu por A Mulher Faz o Homem, A Felicidade não se Compra e Meu Amigo Harvey). Perderia em 1960 para Charlton Heston em Ben-Hur. Aliás, o épico considerado um dos grandes filmes de todos os tempos foi a pedra no sapato de Anatomia de um Crime, que recebeu outras seis indicações (Filme, Ator e Atriz Coadjuvantes, Roteiro Adaptado, Edição e Fotografia em Preto e Branco) e não ganhou nenhum. Um dos destaques da edição é a ausência do uso de flashbacks, técnica odiada por Otto Preminger e que poderia ser usada de qualquer maneira para facilitar a compreensão do filme. Ao optar por não utilizá-la, encontra o roteiro uma proximidade com a realidade de um julgamento que atinge em cheio o espectador. Seu ritmo é tão perfeito que o diretor chegou a processar a Columbia por ter vendido os direitos de Anatomia de um Crime para a televisão, pois o filme de duas horas e quarenta minutos foi interrompido treze vezes por intervalos comerciais! Ele perdeu o processo, claro.

O longa explora seu viés jurídico ao discutir se o caso a ser julgado se encaixa numa “legítima defesa da honra de terceiro”, apesar do fato de o homem violentar a esposa não ter sido tão próximo do segundo evento (admitindo sua cogitação), e da vítima do primeiro ser uma mulher extremamente provocante. Anatomia de um Crime difere de outros dramas de tribunal no fato de o advogado de defesa realizar uma investigação prévia antes de aceitar o caso. Ele precisará construir uma boa imagem de Laura Manion como vítima, enquanto a acusação fará de tudo para ignorar esse fato. O papel estaria muito melhor em Lana Turner, mas essa recusou no auge de sua forma, após lançar A Caldeira do Diabo e Imitação da Vida. Sua negativa se deu porque Turner queria que seu figurino fosse todo desenhado por seu estilista profissional. O estúdio esteve prestes a aceitar a exigência, mas o diretor Otto Preminger vetou a solicitação. Remick, que sempre foi a primeira opção de Preminger, não compromete e três anos depois foi lembrada para vários prêmios por sua boa atuação em Vício Maldito.

A primeira hora do longa se passa fora da Corte. Mesmo assim, nas cenas de julgamento, a produção não deve nada aos melhores do gênero. A grande qualidade do filme é mostrar a busca por e a luta entre argumento, a criação e desconstrução de teses (sem perda de tempo com tramas paralelas). É a verdadeira anatomia de um crime, é Direito puro a exemplo de 12 Homens e uma Sentença e O Vento Será sua Herança. Além de tudo isso, o longa é muito bem filmado e editado. Impressiona saber que sua pós-produção foi feita apenas um mês antes do lançamento. Ou seja, um clássico absoluto. Nota 9



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Amistad



Sinopse: O navio negreiro espanhol La Amistad é capturado na costa dos EUA, depois que os 53 africanos a bordo se amotinam. Durante o julgamento dos escravos, vários interesses entram em jogo: a luta abolicionista, a reeleição do presidente americano, as boas relações internacionais (entre EUA e Espanha, dona do navio). Diante das proporções que o evento toma, o ex-presidente John Quincy Adams (Anthony Hopkins), um abolicionista não assumido, resolve sair da sua aposentadoria voluntária para defender os africanos na Suprema Corte Americana. (Fonte: Cine Click)

Motivo para assistir: O nascimento do sentimento abolicionista nos Estados Unidos

Estreia – 20/02/1998Pablo Villaça em seus comentários sobre Cavalo de Guerra comparou o mesmo a Amistad como tentativas melodramáticas e apelativas de contar uma história. A produção de 1997 lançada entre os premiados A Lista de Schindler e O Resgate do Soldado Ryan bebe na fonte do segundo pelo começo visceral e violento, retratando o motim a um navio negreiro. É contemplativo sem ser bonito, não possui objetividade e é difícil não enxergar ali uma tentativa frustrada de Spielberg em ser experimental.

Ocorre que, por ser o blogueiro um operador do Direito, não há como, mesmo identificando diversos erros em Amistad, não atentar pela maneira fiel como a briga jurídica que ocupa grande parte do filme é mostrada. A discussão para qualificar os negros como propriedade dos donos do navio, dos marinheiros que os encontraram ou da Coroa Espanhola – bem como o nascimento da teoria abolicionista – não permite classificar a produção como ruim.

O longa, por exemplo, revelou Djimon Hounsou, que foi indicado duas vezes ao Oscar de ator coadjuvante, por Terra de Sonhos e Diamante de Sangue. Já Anthony Hopkins foi lembrado pelo Oscar como ator coadjuvante (perdendo para Robin Williams, por Gênio Indomável), que indicou a produção em outras três categorias: Fotografia, Figurino e Trilha Sonora. Porém, o roteiro de David Franzoni (vencedor do prêmio de melhor filme da Academia por ser um dos produtores de Gladiador) sofreu acusação de plágio de Barbara Chase-Riboud, que escreveu livro com a mesma história e chegou a ser levado à produtora Amblin, de Spielberg (e sua compra de direitos, negada).

O viés democrático, o respeito às instituições nas Treze Colônias recém-independentes e a instauração do Tribunal do Júri desde os seus primórdios formam um prato cheio para quem gosta da Ciência do Direito. Os menos familiarizados encontrarão interesse na dificuldade de advogar para pessoas que (literalmente) não falam a mesma língua. Os interessados em Política e História já optarão por observar a gênese da Guerra Civil Americana e a relativização da independência dos três Poderes logo no início da era democrática. Pena que, ao final, voltem as tomadas longas e o ritmo inconstante. Amistad exige boa vontade, mas está longe de ser um fracasso. Nota 6



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quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O Ano que Vivemos em Perigo



Sinopse: Indonésia, 1965. Guy Hamilton (Mel Gibson) é um repórter australiano ambicioso e pouco experiente, que em sua primeira missão internacional chega a Jacarta para cobrir a agitação dos últimos momentos do regime de Sukarno. Lá Guy recebe a ajuda essencial de Billy Kwan (Linda Hunt), um fotógrafo anão, que faz para ele importantes contatos com as facções em luta e lhe apresenta a bela Jill Bryant (Sigourney Weaver), assessora do adido militar da embaixada britânica. Alguns acontecimentos precedem a queda do ditador e dentro deste contexto Guy se envolve com Jill. (Fonte: Adoro Cinema)

Motivo: A vida de um novato correspondente internacional

Estreia - 17/12/1982 (na Austrália) - O australiano Peter Weir, na época com quase 40 anos, conseguiu cavar seu lugar em Hollywood dirigindo em seu país O Ano que Vivemos em Perigo. Sua produção seguinte, A Testemunha, foi responsável pela primeira indicação deste ao Oscar de melhor diretor. Ele foi lembrado na mesma categoria por Sociedade dos Poetas Mortos, O Show de Truman e O Mestre dos Mares. Além da lembrança como produtor na categoria filme em Mestre dos Mares e roteirista de Green Card - Passaporte para o Amor. O argumento do roteiro em questão é difícil de ser criticado. É claro que uma trama que narra a vida de um repórter em sua primeira experiência como correspondente estrangeiro merece um filme. Porém, o roteiro que aparentemente tenciona tratar da responsabilidade social da carreira de jornalista e da dificuldade na busca por fatos sem se envolver com a notícia, sai dos eixos na segunda metade, quando parece perder ritmo e o fôlego.

Por tratar de um tema polêmico, o longa esteve banido da Indonésia até 1999. Um dos equívocos da produção, aliás, é atribuir ao povo javanês diálogos feitos em filipino. Talvez deixar a direção a cargo de Phillip Noyce fosse mais acertada, eis que não foram poucas as divergências profissionais entre Weir e C.J. Koch, autor do livro autobiográfico que dá origem ao filme e colaborador do roteiro. A parte dramática revela-se incipiente e o conflito entre comunistas e direita militar é deixada à parte, o que tira a dinâmica do filme. O elenco é liderado na verdade por Linda Hunt, que conseguiu o Oscar de atriz coadjuvante em 1984 por um feito notável: interpretar um homem. Ela perdeu o Globo de Ouro para Cher por Silkwood - O Retrato de uma Coragem e não foi lembrada nenhuma vez para qualquer prêmio depois disso. O diretor a escalou, aliás, após diversos testes com homem, sem obter êxito.

Mel Gibson que após atingir o estrelato em Mad Max realizou dois filmes com Weir com relativo sucesso (antes deste, eles lançaram Gallipoli) e Sigourney Weaver que também viajava na fama de Alien - O Oitava Passageiro lançado dois anos antes, não comprometem mas não trazem nada de especial aos protagonistas. Os mais novos lembrarão de Diamante de Sangue, com a diferença que neste o protagonista é um local. Além disso, O Ano que Vivemos em Perigo possui montagem e trilha sonora pouco inspiradas e um dilema mal retratado e de conclusão frustrante. Falha ao colocar em pauta a covardia em abdicar da carreira e optar por um quase-amor ao invés de reportar a História. Uma tentativa de se criar um clássico inspirado em um evento real, que só caía bem na época da inocência. Nota 5



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terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Amor à Flor da Pele



Sinopse: Chow (Tony Leung Chiu Wai) e sua mulher acabaram de se mudar. Logo, ele conhece Li-Zhen (Maggie Cheung), uma jovem que também acabou de se mudar com o marido. Ele trabalha para uma companhia japonesa, o que significa que está freqüentemente viajando. Como sua mulher também fica, muitas vezes, longe de casa, Chow passa muito tempo com Li-zhen. Eles se tornam amigos e, um dia, são forçados a encarar os fatos: seus respectivos parceiros estão tendo um caso. (Fonte: Adoro Cinema)

Motivo para assistir: Como Wong Kar Wai marcou definitivamente território no mapa do cinema.

Estreia - 23/02/2001 - O final do século XX despertou a atenção do mundo para o cinema da China. O cinema de Wong Kar-Wai, entretanto, não se assemelha em nada com o de Zhang Yimou, a outra referência por todos utilizada. As histórias exageradas e cheias de fantasias como Heroi, O Clã das Adagas Voadoras e A Maldição da Flor Dourada mudaram um pouco o perfil de Yimou que se destacou no final dos anos 1980 com produções mais intimistas como O Sorgo Vermelho e o espetacular Lanternas Vermelhas. Já Amor à Flor da Pele se aproxima mais do cinema japonês pela simplicidade da trama (apesar do maior uso de movimentos pela câmera) e pelas passagens de tempo utilizadas pelo roteiro, comuns em obras como as de Yosujiro Ozu.

Um encontro constrangedor de um homem e uma mulher, vizinhos de mudança no mesmo dia, é o ponto de partida de um longa que trata de amor e decepção e de como o nascimento de um sentimento depende, sim, de fatores externos e está sujeito às condições de temperatura e pressão. As filmagens tiveram que ser transferidas de Pequim para Macau porque as autoridades chinesas exigiam a leitura do roteiro e Kar Wai nunca usa um script pré-definido. Esse atraso fez com que o corte final ficasse pronto menos de uma semana antes da estreia do longa no Festival de Cannes. O título em inglês, In The Mood of Love é uma referência a uma canção gravada por Brian Ferry.

A bela trilha sonora e a edição ágil revezando cortes bruscos com o uso (moderado) do slow motion intriga o espectador na primeira metade. Porém, Amor à Flor da Pele foi feito para ser apreciado, para documentar e retratar como é normal o desencanto com a rotina de anos de relacionamento e encantar em cenas como a que utiliza apenas as sombras das personagens ou o close de suas mãos. Foi usado muita improvisação, o que fez com que o próprio diretor/roteirista admitisse que o trabalho dos atores fez com que a história saisse do campo da obviedade.

Destacam-se, ainda, uma câmera exploradora bem inserida no cinema oriental e uma presença de fundo de Nat King Cole, uma voz sempre bem-vinda. Na década de 2000, Kar Wai participaria de projetos cercados de expectativas mas nenhum deles conseguiu o mesmo impacto que Amor à Flor da Pele e dos longas anteriores de maior sucesso (Dias Selvagens, Amores Expressos, Cinzas do Passado e Felizes Juntos), todos contando com pelo menos um dos dois atores que lideram o elenco. Vale reparar que a atriz Maggie Cheung está com uma roupa diferente em cada cena, totalizando 46 de acordo com as notas da produção. Tony Leung venceu o prêmio de melhor ator em Cannes e a produção venceu o César de filme estrangeiro. Já em seu país, Amor à Flor da Pele foi superado por O Tigre e o Dragão, de outro mestre - Ang Lee. Nota 8



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segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Feliz que Minha Mãe Esteja Viva



Sinopse: Quando adolescente, Julie (Sophie Cattani) abandonou seus dois filhos, um de quatro anos e o outro ainda bebê. Adotados por um casal, o irmão mais novo cresceu sem crises existenciais, mas Thomas (Vincent Rottiers) sempre quis conhecer suas origens. A raiva que o abandono causou nele começa a se manifestar na pré-adolescência. Aos 20 anos, Thomas toma coragem e fala com sua mãe biológica. Na tentativa de ocupar o hiato da relação entre os dois, força um envolvimento não convencional entre mãe e filho. (Fonte: Adoro Cinema)

Motivo para assistir: Final arrebatador

Estreia - 25/03/2011 - Um filme francês que começa com uma família (pais e duas crianças) saindo de férias e uma introdução que remete ao lugar-comum dos irmãos Dardenne se destaca pela impactante conclusão. Feliz que Minha Mãe esteja viva trata de um tema que não é novo, qual seja, a história de um filho adotivo que procura sua mãe biológica. A tentativa do experiente roteirista Alain Le Henry em trazer algo novo é válida e eficiente, em mais uma produção que ao lado das de Xavier Dolan e outras trouxe uma energia jovem ao cinema francês. Feliz que Minha Mãe Esteja Viva venceu o prêmio de melhor roteito do Festival de Cinema de Montreal.

Produção de curta duração, de cenas simples, não há nela o suficiente para qualifica-la de surpreendente ou de alto nível. Seu ponto positivo é intercalar fases em que as crianças estão vivendo com a mãe verdadeira e passagens com a família adotiva. O novato Vincent Rottiers se sai muito bem como protagonista, em interpretação que rendeu uma indicação ao César de Ator Revelação. A opção do roteiro em não se concentrar em apenas um momento da vida da protagonista dá dinamismo ao filme e provoca situações de conflitos (ex.: Decepção x Ingratidão) bem mais interessantes que os longas dos superstimados Jean-Pierre e Luc Dardennes. Nota 7



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Querelle



Sinopse: Na cidade portuária de Brest, nada é o que parece ser. Neste cenário de sonho, Querelle, um marinho amoral que desperta sentimentos de amor e morte em homens e mulheres, planeja crimes e procura satisfazer os seus desejos. (Fonte: Cine Dica)

Motivo para assistir: Dizer não à intolerância

Estreia - 16/09/1982 (na Alemanha Ocidental) - Um bar à beira de um porto administrado por um homem liberal que não liga se sua mulher faz sexo com a maioria dos frequentadores assíduos. Quando um deles é informado pela face cartomante da senhora citada acima que o irmão Querelle corre o perigo de encontrar a si mesmo, o espectador que ignora a obra do diretor alemão Rainer W. Fassbinder jamais imagina o que está por vir. A trama é baseada no livro de Jean Genet, polêmico escritor que obteve sucesso graças às referências feitas por Jean Paul Sartre. Voltando ao filme, as únicas indicações para a produção na época foram para o Troféu Framboesa de Pior Canção. Porém, o filme foi exibido no Festival de Veneza e perdeu o Leão de Ouro para O Estado das Coisas de Win Wenders. Na época Marcel Carné, o presidente do Júri naquele ano deu uma entrevista mostrando sua frustração por ele não ter convencido os outros jurados a dar a Querelle o Leão de Ouro.

Fassbinder cria um ambiente de cores e trilha forte, faz referência ao experimentalismo dos seguidores de Godard no uso do som, narração e notas escritas ao longo de um filme que, ao contrário do diretor francês, assume o uso de um cenário a todo instante. Tudo para contar como nasce em um homem que convive com e em ambientes heterossexuais o desejo de experimentar o amor de uma pessoa do mesmo sexo. Foi o último longa de Fassbinder, que em 1982 teve uma overdose de drogas aparentemente proposital.

A demora para o filme se definir é proposital para chocar e ofender alguns, desde a referência à crucificaxão de Cristo até as cenas de sexo aparentemente gratuitas de tão grotescas. Porém, quando foca nos sentimentos de dúvida, amor, obsessão e deslumbramento (todos em conflito) a história cresce pela coragem em marcar uma posição. Talvez a inversão na maneira de destrinchar o roteiro fosse uma opção mais acertada. Porém, não tira a qualidade de Querelle, pronto para entrar em cartaz essa semana com o mesmo frescor de três décadas atrás. Nota 7




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sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

O Espião que Sabia Demais




Estreia - 13/01/2012 - Não é simples transpor para o cinema um livro de John Le Carré. Suas adaptações sempre geraram expectativas e invariavelmente envolveram atores consagrados. Entre as mais conhecidas, “O Espião que Veio do Frio” (1965) e “O Alfaiate do Panamá” (2001) tiveram os astros Richard Burton e Pierce Brosnan. “A Casa da Rússia” (1990) trouxe o encontro de Sean Connery e Michelle Pfeiffer. O esquecido “A Garota do Tambor” (1984) foi protagonizado por Diane Keaton. E a mais bem sucedida e recente de todas, “O Jardineiro Fiel” (2005) não só lançou o diretor Fernando Meirelles nas produções internacionais, como ainda rendeu o Oscar e o Globo de Ouro para a atriz Rachel Weisz.

Em “O Espião que Sabia Demais”, novamente um excelente trabalho foi realizado na escolha do elenco. A trama da nova adaptação, que já rendeu uma célebre adaptação televisiva em 1979, no formato de minissérie estrelada por Alec Guinness (“Guerra nas Estrelas”), gira em torno de uma célula da Inteligência Britânica onde paira a suspeita de haver um traidor. Uma missão enviada à Hungria é mal sucedida, alguns agentes são convidados a se aposentarem e um deles, George Smiley (Gary Oldman), volta do seu descanso para solucionar a questão.

Grandes atores britânicos da atualidade foram convidados para desempenhar os personagens, de Colin Firth (“O Discurso do Rei”) a Tom Hardy (“A Origem”), não pairando nenhuma reparação a respeito de seus desempenhos. Um bom trabalho foi igualmente realizado na parte técnica. Mesmo assim, o filme parecer pecar na escolha das tomadas, cores e figurino – o que o deixa um pouco monocromático. Esta opção estética acaba por se mostrar equivocada em uma trama com um infindável número de personagens, todos com maneira de falar e se portar idênticas, sem que haja aprofundamento de suas personalidade ou algo que os distingua além do fato de serem interpretados por atores famosos.

O maior deslize, porém, encontra-se no roteiro, que os seis meses da fase de edição não conseguiram consertar. Há em “O Espião que Sabia Demais” subtramas desnecessárias, que tornam o filme arrastado e cansativo. Em determinada cena, o público se torna olhos e ouvidos de uma personagem que mal foi introduzida na história. Uma adaptação confusa do diretor sueco Tomas Alfredson (“Deixe Ela Entrar”), que é anunciada pela Playarte (distribuidora do longa no Brasil) como forte candidato ao Oscar de 2012. A produção ganhou um troféu técnico do BIFA, prêmio para o cinema independente britânico. E só. Nota 4

ps.: Esse texto também foi publicado no portal Pipoca Moderna, clique aqui para ler.



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