segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Émile Zola



Estreia – 2/10/1937 (nos EUA) – A Warner estava se tornando o estúdio mais popular de Hollywood e colhia frutos da aposta de trazer biografias de personalidades mundiais do século XIX. A Academia já havia reconhecido a qualidade desses filmes dois anos antes, com A História de Louis Pasteur. O longa, dirigido por William Dieterle e com Paul Muni no papel principal, foi indicado ao prêmio de Melhor Filme e venceu nas categorias de Ator, Roteiro e Roteiro Original (Muni também venceu o prêmio por sua atuação no Festival de Veneza).

Émile Zola (também chamado de A Vida de Émile Zola) repete a dobradinha Dieterle-Muni mais uma vez para contar a história do escritor francês. O diretor alemão, que desembarcou em Hollywood em 1931 e já chegou chutando a porta com Kismet (refilmado treze anos depois), se juntaria a Charles Laughton para a versão definitiva de O Corcunda de Notre Dame e produziria bons clássicos como Salomé e No Caminho dos Elefantes. Porém, com Émile Zola ele conseguiria sua única indicação ao Oscar. O ator seria lembrado pela quarta vez em cinco anos, mas sua filmografia não seria tão extensa quanto o seu talento. Porém, ele ainda seria apontado mais uma vez em 1960 por Rebeldia de um Bravo. Engraçado que Émile Zola foi filmado de trás para frente já que Muni tinha a barba branca que depois seria escurecida nas últimas cenas (que na verdade são as primeiras, entendeu?).

É claro que Émile Zola fica prejudicado ao ser comparado com Ziegfeld, O Criador de Estrelas, último filme que assisti antes dele. São duas biografias primorosas, mas a qualidade da produção que conta a vida do produtor de teatro americano (indiscutivelmente menos relevante culturalmente que Zola) deixa a Warner no chinelo. O encanto começa a se quebrar quando os créditos, ao anunciar que fomos transportados para a Paris de 1862, informa que há fragmentos ficcionais na história a ser contada. Isso envelhece o filme, já que é uma difícil tarefa hoje em dia identificar quem realmente existiu em meio àqueles personagens (exclui-se Paul Cézzane e Émile Zola).

As imagens do DVD revelam que a produção do longa vencedor do Oscar de 1938 é menor (ou o trabalho de preservação dos negativos foi menos eficiente que os três ou quatro vencedores anteriores). Só deve ser impressão porque o longa saiu vencedor dos prêmios de Filme, Roteiro e Ator Coadjuvante (Joseph Schildkraut) e foi indicado para Diretor, Ator, Direção de Arte, Assistente de Direção, Som, Trilha Sonora e Roteiro Original. É verdade que os jovens Cézzane e Zola vivendo de sonhos na Paris de meados do século XIX desperta imediato interesse. Porém, a carreira do escritor começa a entrar nos eixos quando sua mãe e noiva conseguem um emprego em uma editora, onde ele poderia ganhar com o exercício de sua arte. Mesmo vivendo com dificuldades, Zola continua escrevendo sem abandonar seu estilo, na estética do desagradável e retratando os sofridos drama da população mais humilde.

Com esse ideal de descrever as mazelas do povo, demonstrando um fortíssimo sentimento de humanidade, Zola atinge o sucesso com o lançamento de Nana, mulher com drama pessoal muito forte. Até esse ponto somos presenteados com uma atuação contida, primando pela serenidade, de Paul Muni. Nessa primeira metade ainda há espaço para discutir o que o roteiro chama de “espólio da guerra” e que no fundo é aquela mensagem de sempre de um país entrar em um conflito baseado em factoides e mentiras (já tratados aqui no blog quando comentamos Cavalgada, Sem Novidades no Front, entre outros).

Na sequencia da carreira, Zola lança A Derrocada, Germinal e vai publicando outros livros, sempre com um discurso politizado e colecionando sucessos. Porém, essa biografia ligeira prepara o terreno para tratar de um fato específico da vida do escritor. É nesse momento que o roteiro se perde um pouco. A montagem e edição esquece que estamos diante da vida de Émile Zola e joga na tela o episódio de um vazamento de informações no Exército Francês. Os oficiais condenam um bode expiatório para manter a credibilidade das Forças Armadas perante o povo e o coitado vai para o exílio. Essa ponta solta deixa a impressão de que a história do longa poderia ser um pouco melhor. Paul Cézzane é pouco explorado mas é da boca dele saem pérolas como a teoria de que o artista deve permanecer pobre, para que seu estômago e talento não fique inchado e empanturrado. (mesmo que você não concorde).

Depois disso o roteiro se limita a mostrar a luta da esposa do oficial e de Zola para, três anos depois, provar a inocência do homem. Utilizar o escritor como último recurso fez com que este perdesse sua credibilidade perante a nação francesa, que opta por acreditar até o fim no discurso oficial. É justamente motivado pelas palavras de Cézzane que Zola (com um Paul Muni envelhecido porém com mais vigor) troca a glória da Academia Francesa de Letras pela última e mais difícil defesa de sua vida. Zola mostra que além de grande escritor possuía oratória privilegiada.

Com aproximadamente uma hora e vinte minutos já com a população se revoltando contra o biografado e queimando seus livros em praça pública, o longa se atém na Corte Marcial e vira, por alguns momentos, um filme de tribunal (e longe dos melhores). Todavia, os julgadores parecem dispostos a mudar a história oficial e absolver tardiamente o homem. Já Zola, que com o passar do tempo fica menos falante, acha forças para lutar contra o Tribunal, o Exército e o Estado, que utilizam todas as armas para que a decisão seja mantida.

Os vinte minutos finais mostram a disposição de um Zola derrotado em transformar o que parecia o fim de uma guerra em o início de uma nova batalha. Utilizando novamente da escrita e exilado em Londres, seus textos provocam uma pressão por parte da opinião pública que passa a exigir uma nova investigação. A cena da libertação do injustiçado é marcante (o ator Joseph Schildkraut, não acreditando no que lhe acontece, entra e sai da sua cela diversas vezes em cena que o ajudou muito a levar a estatueta para a casa). Porém (e como sempre) a graça dos clássicos fica por conta do epílogo. Em um lindo discurso ficamos sabendo porque Émile Zola conseguiu se tornar inesquecível em um país tão rico em ídolos como a França.

Para ficar “só” com a última frase, Zola foi “um monumento da consciência humana”. Repito, é um lindo discurso. Pena que o jeito de produção pequena e um claro envelhecimento no ritmo e na linguagem faça com que Émile Zola se perca em meio a clássicos esplendorosos. Nota 7




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